#Mimimilho: A tortuosa questão do milho na cerveja

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espiga milho compac

texto e fotos: Cilmara Bedaque e divulgação

Já há algum tempo, o Lupulinas quer falar sobre a adição de milho (e arroz) na cerveja. Isso porque este assunto virou uma grande oportunidade para todos estudarmos, aprendermos e não sairmos por ai repetindo as coisas de orelhada.

Sim, porque neste mundo da cultura da internet™ grandes mentiras viram verdades e grandes verdades viram piadas. O milho, depois de usado pelas grandes cervejarias para baratear seu custo, produzir teor alcoólico e, além de tudo, ser escondido nos rótulos sob o cognome de “cereal não maltado” foi chicoteado, esquartejado e ofendido em sua nobreza de grão. O problema não é o milho, mas sim o uso que essa indústria fez dele. Aí começou essa ignorância que só malte de cevada era cerveja e que outras experiências procurassem outro nome. O grau de ataque é nível torcida de futebol enfurecida.

Todos têm que ter opinião para tudo? Vamos lá. Fui averiguar o assunto. Oh! A mais antiga “cerveja” encontrada na China era feita de arroz? Os rígidos alemães usaram milho para retirar a opacidade de suas cervejas? Muitos iniciantes no consumo da cerveja artesanal aceitam com felicidade as cervejas de trigo? Os andinos faziam sua cervejinha (chicha) mastigando milho? Existe um estilo de IPA chamado Rye IPA que usa até 20% de centeio? Experimentei outro dia uma deliciosa cerveja peruana feita de quinoa?

Aí veio a AMBEV e se associou à Wäls e à Colorado e muitos ~entendedores~ começaram a falar que todo produto que estas pioneiras cervejarias artesanais produziriam seria feito com milho. Nesse tipo de raciocínio há muita culpa da própria Ambev que, pelo jeito, aprendeu com a Kirin que não precisa fazer a política da terra arrasada. Até a Stella Artois feita aqui pela Ambev foi “abrasileirada” e perdeu seu marcante aroma ainda encontrado pelo resto do mundo. Isso sem falar na Original, Serramalte e outras cervejas “adaptadas”. Parece que nessas recentes associações há um novo espírito dentro da grande indústria. Óbvio que essa intenção precisa ser comprovada ao longo do tempo.

Mas aí já que virou o #Mimimilho, os irmãos Carneiro – da Wäls – partiram pra ousadia. Já que estavam acusando suas cervejas com argumentos tão falsos, eles lançaram semana passada e, em breve, deve estar nos supermercados, a Wäls Hop Corn IPA com 15% de milho anunciado no rótulo! (Transparência, que beleza!) Na verdade é usado um xarope chamado de High Maltose que fermenta ajudando a dar teor alcoólico à cerveja. Como a paixão por lúpulos está em alta *-* eles abusaram da quantidade e da variedade (Columbus, Cascade e Amarillo e finalizada com um dry hopping de Centennial). A Hop Corn tem 6.7% de teor alcoólico, 70 IBUs e uma leveza que garante sua bebalidade por um bom tempo.

Pra completar o serviço, os irmãos Zé Felipe e Tiago Carneiro, junto com a Bohemia, colocaram no rótulo saquinhos de pipoca cheios de lúpulo e conclamaram todos nós a derrubar um muro de falso conhecimento que só faz mal para a evolução da cerveja.

Outra bem humorada cervejaria brasileira – a 2cabeças – também entrou na pretensa polêmica do #Mimimilho e produziu, em colaboração com a cervejaria dinamarquesa Amager Bryghus, a Marry Me in Rio, uma Cream Ale com lúpulos Simcoe, Sorachi Ace e Centennial e 10% de flocos de milho e arroz. O Lupulinas adorou que no rótulo o casamento retratado fosse o de duas mocinhas \o/ E como a 2cabeças capricha, as mocinhas são uma loira, outra morena, são peitudonas e ainda têm o Cristo Redentor acima de braços abertos :D

Então é isso: muitas vezes a piada e o sectarismo escondem a verdade e a melhor coisa pro consumidor é beber a cerveja que gosta, ler em seu rótulo do que ela é feita e brindar com seus amigos.

PS.: Agradeço a todos os colegas blogueiros ou produtores de cerveja que me elucidaram, através de leituras ou de bons papos, sobre os vários aspectos desta questão.

 

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Comentários (63)

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Só uma correção, normlamente nos rótulos das cervejas populares brasileiras, o milho aparece junto com outras substâncias desconhecidas sob o nome de "cereais não-maltados". Até existe malte de milho, mas não é utilizado nesse tipo de cerveja.
1 resposta · ativo 506 semanas atrás
A mataria não esclarece nada. Afinal quando bebo uma cerveja comum, no balcão da padaria, estou bebendo milho, arroz ou o que?
Estou sendo engabelado pela AMBEV, é isso. Gato por lebre?
5 respostas · ativo 428 semanas atrás
Cilmara,

brilhante texto. Poucas coisas são mais chatas de discutir com os amigos e "entendededores" o #mimimilho. Achei fantástica a iniciativa da Wals. Um monte de gente que não entende 1 milésimo do que o Tiago e o Felipe entende ficam criticando sem nem ter provado a cerveja.

Cerveja boa é aquela que voce gosta. Simples assim.

Parabens mais uma vez pelo texto.

Saude !!
Guilherme
1 resposta · ativo 506 semanas atrás
Oi Cilmara, achei o seu texto muito relevante.
Eu sou desses que entende um pouco de cervejas, pero no mucho, mas um dos pontos que eu considero nessa questão do mimimilho não é somente o fato de ter ou não ter milho (ou outros grãos) na fórmula, mas sim a prática de algumas cervejarias de "corromper" algumas receitas, com ingredientes de baixa qualidade (independente de quais sejam) para aumentar usas margens de lucro em detrimento da qualidade do produto oferecido.
Esse tipo de "downgrade" na fórmula já aconteceu bastante na indústria da cerveja e também em outras como a de refrigerantes, chocolates, etc.
Acredito que parte do receio em relação à compra da Wals é essa de haver alguma política comercial que corrompa as excelentes cervejas que eles produzem.
Obrigado mais uma vez pelo texto, um abraço!
Guilherme (outro Guilherme)
1 resposta · ativo 423 semanas atrás
ok. nas sociedades cervejeiras antigas o milho teve seu destaque, mas a Ambev usa milho transgênico fo qual não sabemos seu efeito a longo prazo... este é diferente concorda.
1 resposta · ativo 506 semanas atrás
Achei que fosse ler algo sobre o fato do milho adicionado nas cervejas brazucas ser transgênico. Ficou faltando isso na matéria.
1 resposta · ativo 506 semanas atrás
"Cerveja boa é a que agente gosta". Concordo. Continuo a beber a minha cerveja feita com água, malte e lúpulo. Sem trangênicos, de preferência.
Cerveja é um fermentado de grãos, milho incluso, mas uma cerveja de verdade é MUITO diferente de uma skol... Beijos, Cilmara :)
1 resposta · ativo 506 semanas atrás
Que materia horrivel, grato.
Volto mais não.
1 resposta · ativo 506 semanas atrás
Prezado,

O seu texto está com uma informação incorreta. No rótulo das cervejas populares é informado que contém "cereais NÃO maltados". O milho está "escondido aí! No seu texto você diz cereais maltados.
1 resposta · ativo 506 semanas atrás
Já fiz cervejas apenas com milho, que eu mesmo malteei, e ficaram ótimas. Particularmente, acho o milho um cereal mais "nobre" que a cevada ou o trigo, basta ver os inúmeros usos dele na culinária e o sabor mais característico, quando comparado com os outros grãos.
4 respostas · ativo 423 semanas atrás
talvez uma das questões pouco discutidas seja a busca das indústrias de cerveja pela redução dos custos e aumento dos lucros por meio do uso de milho transgênico que é mais barato, pois é commodity alimentar e recebe uma série de incentivos públicos no processo produção - financiamento, isenção de impostos, etc...
o milho é lindo, faz parte da nossa cultura alimentar, mas milho transgênico não é comida, nem bebida de verdade!
então, faz sentido boicotar a cerveja elaborada com milho no Brasil...
1 resposta · ativo 506 semanas atrás
Legal, concordo com a afirmação de que o milho ou qualquer outro cereal não maltado não necessariamente é sinônimo de cerveja ruim e há, sem dúvidas, muito fanatismo em cima do assunto. Mas na boa, desconfio sempre das praticas da ambev. O negócio deles é monopólio e esse interesse súbito em cervejarias artesanais é só para se garantirem em um mercado que vem crescendo muito nos últimos anos. Sobre a wals, a cerveja pode ser ótima, conhecendo a qualidade das cervejas wals, muito provavelmente será, e acho estupidez alguém não experimenta-la só por conta do milho, mas não me venha com essa de que estão quebrando paradigmas e blá blá blá, Fizeram parceria com um gigante que usa grandes quantidades de milho na maioria de suas cervejas, óbvio que vão fzr um lobby a favor do cereal agora. Isso é só propaganda, como qualquer outra da Ambev.
1 resposta · ativo 506 semanas atrás
"Grãos adjuntos, como o milho e o arroz, ou sacarídeos simples, como o amido, o xarope ou o açucar cristalino, afinam o sabor. Isso pode tornar uma cerveja pesada mais palatável. (...) Em cervejas mais leves , servem apenas para cortar custos ou simplificar o gosto de uma cerveja já muito fina." (Atlas da Cerveja, de Webb e Beaumont. De acordo com esses autores, uma cerveja com teor alcoólico de 9% suportaria a troca de até 15% de seus açucares (ex. tira-se até 15% do malte de cevada e acrescenta-se 15% de milho, xarope ou açucar)

Pesquisa da USP indica que certas marcas contém até 50% de milho (ou outras fontes de açucares). A legislação brasileira permite esse uso até 50%. Talvez pelo fato das grandes fábricas de cerveja serem financiadores de campanha, não há lei que regulamente a descriminar no rótulo qual adjunto é utilizado e qual a proporção. Segundo essas marcas, fazem essa adição porque os brasileiros preferem uma cerveja aguada e sem paladar. Ou será que os brasileiros bebem isso e acham que gostam porque não tem muitos parâmetros para comparar?

Há um ano comecei a fabricar cerveja caseira e depois disso torna-se uma tarefa difícil tomar essas comuns. Outro dia fui a um bar que só tinha Brahma, Skol, etc. Pedi outra coisa para beber: um caldo de mandioca.

A Ambev compra duas cervejarias artesanais famosas (Walls e Colorado) e a primeira coisa ação que faz é produzir receitas com milho. Chamam de ousadia e tal. Eu prefiro chamar de marketing. Se está havendo uma conscientização dos consumidores, que tendo acesso a cervejas artesanais sem adjuntos (ou usados na dosagem adequada), a Ambev sente-se ameaçada de que o paladar dos consumidores se torne mais exigente e ela tenha que usar mais malte e menos milho nas suas receitas. Ou seja: reduzir sua margem de lucro.

Reduzir custos é a lei das grandes empresas. Qualidade e sabor vem em segundo plano. Alguns exemplos: requeijão com amido de milho (maizena), sorvete entuchado de gordura hidrogenada, glutamato monossódico em quase todos alimentos industrializados salgados...

Tirem suas conclusões. Podem até chamar de mimimilho se quiserem. E se depois de experimentar cervejas de qualidade ainda acham a Brahma e cia boas, sorte sua: vai gastar menos dinheiro pra tomar uma. :)
2 respostas · ativo 483 semanas atrás
Adalberto, Me procure no facebook e leia minha resposta aprofundando seu raciocinio. O site aqui e parcial e bloqueou minha resposta ao seu comentario.
Fato é, durante 40 anos consumi produtos Ambev ( um pouco menos considerando q a Ambev comprou a Brahma, Skol, Antartica, etc.... mais recentemente)..... Nos últimos anos sofrendo de azia, gases e bolhas com puz na sola do pé..... Triste nâo. Mudei para o exterior e hoje só consumo cerveja artesanal Belga....todos esses sintomas desapareceram. Cervejaria comandada por banqueiros....ótimo para os negócios, péssimo para o produto....
1 resposta · ativo 505 semanas atrás
Sinceramente o texto é muito claro e elucidativo da importância do milho e de outros cereais na composição dos ingredientes para a fabricação de cervejas. Inclusive faz menção ao mau uso da indústria(AGRONEGÓCIO SUBENTENDIDO) de tais matérias-primas que hoje constituem uma das commodities de grande importância econômica no cenário do mercado mundial de negócios especulativos e lucrativos(ver dados de órgãos especialistas, referente a estatísticas macro-econômicos que explicam tal fenômeno).
É o uso indiscriminado, mercenário, concorrencial, não só de tais produtos, mas como de todo os bens de valor de uso e troca de interesse da sociedade e fundamentais para a sua sobrevivência social que torna as mercadorias assim produzidas fetiche de uma monta só.
Assim válido é não só para a cervela com para toda a gama de materiais produzidos por esse arsenal mercadológico de super-produção mercantil capitalista, a sua natureza viciante e perniciosa, centro da irracional reverência de homens convertidos em potenciais admiradores e consumidores vorazes do germe promotor da acumulação capitalista.
Mimi(milho, cevada, trigo, soja, arroz, quinoa, amaranto, lúpulo, álcool, feijão, café, cana, carne, frango, aço, ferro, carro, petróleo, energia elétrica, gasolina, diesel, ...mercadoria).
1 resposta · ativo 505 semanas atrás
Achei que o texto fugiu do assunto. Mas valeu pelo debate, nos comentários tem informações conclusivas
1 resposta · ativo 505 semanas atrás
texto fraco, não discute a questão que se propõe, parece que a única conclusão, além dos anúncios das novas cervejas e tendências, é a de que cada um deve apreciar sua cerveja independentemente dos sues ingredientes. Isso, convenhamos, é o óbvio! E a questão do "deve-se ou não por milho na cerveja", que tipo de milho usar, em qual processo... nada é respondido! e as questões do parágrafo 3? só deixa o leitor mais curioso...
1 resposta · ativo 505 semanas atrás
Não concordo com a matéria, a Reinheitsgebot, (Lei da Pureza da Cerveja), promulgada em 1516, reconhecia apenas: Água, Malte de Cevada e Lúpulo (Não era conhecida a Levedura na época), a maioria das cervejarias hoje na Alemanha, ainda produzem suas cerveja seguindo a Reinheitsgebot. Tenho minha opinião formada e hoje só bebo cerveja feita com Água, Malte de Cevada e Lúpulo. Não bebo mais Brahma, Skol, Original, Bohemia, acho o fim do mundo a Stella Artois, principalmente a Baden Baden, custarem um absurdo e ser produzida com cereais não maltados. A única que bebo com muito gosto, das cervejarias de grande porte, é a Heineken.

Grato!
2 respostas · ativo 390 semanas atrás
É uma pena que os 'grandes' cervejeiros artesanais e os formadores de opinião da área estejam perdendo uma oportunidade histórica (no ensejo do 'boom' no consumo das artesanais nos últimos anos) de se colocarem politicamente em relação à adição de milho nas cervejas. Comparar, para ficar em um só exemplo, a bebida andina proveniente de milho com o milho usado no Brasil pela Ambev é um argumento de dar vergonha, falacioso. Estude um pouquinho sobre os milhos crioulo típicos da região dos Andes e verá que você está comparando coisas incomparáveis - usando, portanto, um método argumentativo que beira a manipulação do discurso.

Não se pode usar um dado histórico e cultural como este para justificar a política do agrobusiness que massacra os pequenos cervejeiros no Brasil. Todos sabemos que somos o país das commodities, e que é justamente essa característica que nos faz, historicamente, bebedores de refugo de milho transgênico. É triste ver pessoas inteligentes que poderiam colaborar com uma mudança de mentalidade e estrutura de produção vestirem a camisa do mimimilho. A transgenia deve SIM ser discutida pelos cervejeiros, porque diz respeito à qualidade de seu produto e a um princípio fundamental do universo artesanal - aquele que versa sobre uma "cultura" cervejeira, que não é a cultura do mercado.

A transgenia e todo o mais que engloba o assunto (de grilagem de terras no Brasil à soberania alimentar) são assuntos espinhosos, mas não podem deixar de ser debatidos. Fugir da raia é um brinde à ignorância e à oportunidade de se fazer um debate sério.
Bem legal o texto. Confesso que até quebra um certo preconceito absorvido por mim, embora eu consuma cerveja de milha na buena..
1 resposta · ativo 498 semanas atrás

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